sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Reconhecendo

99% das pessoas que conheço sabem para qual time eu torço. E, destas, 90% sabem quem eu tenho como maior rival. Diferentemente da maioria dos santistas, que trata o Corinthians como maior adversário, eu coloco nesse posto o São Paulo. Herança de ter sido pré-adolescente na fase mais dourada do clube do Morumbi, talvez.

Com tal "DNA", seria fácil eu endossar a maioria dos não-tricolores e desmerecer a figura de Rogério Ceni. Mais: poderia ir na corrente que trata Marcos, do Palmeiras, como o maior goleiro da nossa geração. Porque parece ser impossível discutir Marcos sem falar de Rogério, e vice-versa; é como o debate sobre Rolling Stones e Beatles, Pepsi e Coca, Nintendo e Sega (nos anos 90, ao menos). Uma coisa chama a outra.

Mas não consigo abraçar essa filosofia. Não, Rogério não é meu ídolo, longe disso. Sua personalidade e um quê de arrogância - que acaba sendo uma espécie de síntese da arrogância de grande parte dos tricolores - afasta qualquer probabilidade de um não-são-paulino tê-lo como ídolo. Ainda mais em comparação com o carisma e as boas declarações de Marcos (taí de novo a comparação; ela aparecerá mais vezes ao longo do texto, já adianto).

A questão é que não dá para não considerar Rogério Ceni um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro. Sim, isso mesmo: um dos maiores da história do nosso futebol. Vou desenvolver meu argumento em tópicos.

Constância
Em 1997, Júlio César e Rafael, os hoje goleiros titulares de Corinthians e Santos, tinham respectivamente 13 e 7 anos. Marcos era reserva do Palmeiras (a titularidade só veio em 1999). Já Rogério assumia o posto de titular do São Paulo em substituição ao ídolo Zetti. Antes, tinha feito atuações boas pelo time (entrando às vezes ou como titular no lendário Expressinho), o que o credenciou a assumir a camisa 1.

Já em 2011, Rafael e Júlio César são titulares dos seus times, como já dito, e Marcos, devido a condições físicas, alterna atuações e períodos no departamento médico do Palmeiras. E Rogério Ceni segue titular incontestável no São Paulo.

De 1997 para cá, a condição de titular de Rogério Ceni jamais foi severamente ameaçada. Sim, houve o episódio do Arsenal e alguns outros instantes em que seu posto foi questionado, mas nunca "pra valer". Assim como é hoje em dia. E deverá ser até Rogério encerrar a carreira.

Liderança e as faltas
Entre os que preferem Zetti a Rogério Ceni como principal goleiro do São Paulo pós anos 80, um argumento típico é dizer que Zetti era "mais goleiro" e que Rogério se destaca apenas por ser um bom líder e marcar muitos gols.

É até uma linha lógica de pensamento. Mas... então o que Rogério faz além das defesas não pode ser considerado? Temos que "excluir" a característica de um jogador, na hora de compará-lo com outro? Ora, Rogério é cobrador de faltas e pênaltis sim, e também um capitão, e não há como retirar isso de sua trajetória no tricolor. Seus gols foram (e têm sido) importantíssimos para muitos dos triunfos do São Paulo. Não são meros acessórios, meros enfeites. Assim como sua liderança. Todo time precisa de um capitão - e se esse capitão tem identificação real com a casa, melhor ainda.

Tenho certeza que o São Paulo jamais teria tido aquela sensacional sequência entre 2005 e 2008 - um título Mundial, uma Libertadores, um Brasileiro e um Paulista - não fossem os gols e a liderança de Rogério, além, claro, de suas defesas.

Seleção brasilera
Há quem diga que Rogério só não fez "mais" na seleção brasileira por ser um cara politizado, que não aceita maracutaia, e blablabla. Isso é balela das mais furadas. Ninguém que seria tão ferrenho opositor da CBF seria convocado para duas Copas do Mundo e tantas outras ocasiões.

E se Rogério não teve a chance de ser titular da seleção em uma Copa do Mundo (ainda que tenha motivado uma histórica substituição de goleiros, algo que o Brasil jamais havia feito em mundiais), não se pode dizer que ter ido a duas - ainda que como reserva - não seja um feito expressivo. Uma Copa do Mundo é para poucos; duas, para pouquíssimos.

Mil, e contando
Rogério chegou agora aos mil jogos pelo São Paulo, marca alcançada no futebol brasileiro apenas por Pelé e Roberto Dinamite (preciso falar os clubes?).

O feito é muito expressivo. Não por ter sido conquistado em 2011, em tempos de futebol profissional - não podemos esquecer que Rogério é goleiro, e goleiros acabam naturalmente permanecendo mais nos clubes. O que chama a atenção é a quase inexistência de lesões e períodos de grandes ausências. É só comparar que Marcos, da mesma idade que Ceni, tem pouco mais de 500 jogos pelo Palmeiras.

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Concluo o texto enfatizando algo óbvio: reconhecer é uma coisa, admirar é outra. Torço contra Rogério Ceni, simplesmente pelo fato dele representar o clube que, como dito no início do texto, tenho como principal rival no futebol. O que não me faz desmerecer tudo o que ele faz e fez pelo São Paulo e pelo futebol brasileiro como um todo. Rogério é digno de aplausos e merece ser reconhecido como um mito. Ainda que não se goste de sua personalidade.

Foto: www.saopaulofc.net

3 comentários:

Eduardo Maretti disse...

É tudo verdade, ótima análise sobre os goleiros dessa geração pós-anos 80. Cabe acrescentar que muitos torcedores(mas principalmente entre goleiros profissionais) citam como "maior ídolo" o Taffarel. Já vi uns 2 ou 3 goleiros (não lembro quis) dizerem que Taffarel é "muito técnico", ou "o mais técnico que vi"...

Sob esse aspecto Rolling Stones x Beatles, Pepsi x Coca etc., não me sinto obrigado a dizer um ou outro. Acho que Marcos e Ceni são os dois grandes do período. Taffarel vem depois. Não gosto nem do velho Valdir Peres dos anos 70 (um frangueiro) nem do Júlio César (inter de Milão e seleção). Pra mim são duas farsas.

E, Olavo, eu sei perfeitamente o esforço psicológico que você fez para escrever este post. Parabéns por isso! hehe

Cauê Muraro disse...

Mesmo entre são-paulinos, há quem tenha ressalvas com relação à postura do Rogério. Mas você tem toda a razão: em termos, vamos dizer assim, técnicos (e "clubísticos") o homem é herói. Houve, durante um período, críticas por causa daquele hábito de se ajoelhar nas saídas do gol. Ou de, em vez de tentar a defesa, levantar a mão direita, olhando para o juiz ou para o auxiliar. Só que até isso parece ser menos comentado, hoje.

milho disse...

Rogério Ceni só se salva pq gosta de rock