segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Por que o Santos precisa do G4

A vaga na final da Copa do Brasil veio de maneira tranquila. Seria então natural que o time concentrasse seus esforços para a decisão do mata-mata e não mais largasse força nas quartas e domingos do Campeonato Brasileiro.

Mas o Santos não pode pensar dessa forma. E explicarei o motivo.

Houve um tempo em que o Santos não ganhava títulos. Não preenchia, e pronto, sua sala de troféus com novas taças. Foram os sombrios anos 80 (os quais pouco acompanhei) e 90 - desses sim participei, digamos, de camarote.

À época, o Brasilerão não se fazia por pontos corridos. Os regulamentos se alteravam a cada ano. Mas permanecia, em todas as ocasiões, o que chamávamos de "fase decisiva". Fosse o mata-mata puro e simples de 96, 98 e 99; os grupos semifinais de 92, 93 e 97; a insanidade de 94 ou o sistema de dois turnos com mata-mata de 95, o que importa é que havia ali, naquelas ocasiões, o sentimento de "precisamos nos classificar", "na fase seguinte que o bicho pega" e quetais.

Pois bem; mesmo sem levantar taças, o Santos se fazia presente com boa frequência nesses contextos derradeiros. Em todos esses campeonatos que mencionei, só não esteve nas cabeças em 94, 96 e 99. Ali - ainda que com um desfecho frustrante - sabíamos que havia uma relevância nacional, uma chance de título, um motivo para dizer que, bom, pelo menos um dos degraus foi transposto.

Os pontos corridos mudaram o cenário e, hoje, para quem não cai e nem é campeão, a alegria resume-se a chegar ao G4. É o tal passaporte para a Libertadores - vale lembrar que foi por esse caminho que São Paulo e Internacional pavimentaram suas estradas para as conquistas recentes (2005, 2006, 2010).

Agora somemos os dois elementos citados neste texto para chegar à sua conclusão. O Santos está a um mata-mata com o Palmeiras - no qual entrará em campo com favoritismo no mínimo igual ao do adversário - de "pegar vaga na Libertadores" (as aspas aí se apresentam porque ganhar uma Copa do Brasil é muito mais que isso; é titulo, caras!). Por isso poder-se-ia pensar que o Brasileiro poderia não ser a prioridade do momento.

Mas o Santos não pode se conformar em não figurar, por tanto tempo, entre os melhores do campeonato nacional. O jejum é longo - o time não fecha o certame no G4 desde 2007, quando foi vice-campeão com um elenco que contava com Antonio Carlos Zago (!), Petkovic (!!) e era comandado por Vanderlei Luxemburgo.

Já que não há as fases de classificação dos anos 1990, é ao G4 que temos que nos fiar. E é isso que o Santos precisa buscar agora.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Demissão de Enderson, "alma do torcedor", e lá vamos nós começar tudo de novo

OK, vamos lá: Enderson Moreira foi demitido do Santos hoje.

Aliás, foi demitido não. Nem isso dá pra saber. A bizarrice começa aí. O cara treinou o time de manhã, deu coletiva normal à imprensa, na hora do almoço começam a pipocar os boatos sobre sua saída e o presidente Modesto Roma Júnior ratifica, à tarde, o desligamento. Mas joga à imprensa: ele não foi demitido. Saiu porque quis. Então um cara que deu treino normal no início do dia, quando chegou o almoço, talvez motivado por uma azeitona com caroço mais volumoso do que devia ou por um refrigerante sem gás, resolveu quebrar seu vínculo contratual com o clube que o empregava.

Vínculo esse que vinha resultando um trabalho que, sei lá, ficava numa faixa entre 6,5 e 8, dependendo do gosto do freguês. O Santos não estava encantando ninguém - mas também estava longe de fazer feio. A classificação ao mata-mata do Paulista já está encaminhada e a forma do time sugere um Brasileirão que, se não de título e nem de vaga na Libertadores, ao menos não é (seria?) de luta contra o rebaixamento.

Mas a parceria acabou. E mesmo com o Santos estando invicto neste ano.

Não há, como já adiantado, uma explicação precisa para a saída de Enderson. Mas todos os caminhos apontam para um rumo só: problemas entre ele e os jogadores da base, mais notadamente Gabigol. O choque entre o treinador e o atacante era público e notório e, coincidentemente ou não, Gabriel desceu bem de nível a partir do início do segundo semestre de 2014.

E, bem, chegamos ao cerne do meu texto. Eu já havia adiantado - em post de janeiro - a linha do raciocínio que adotarei a partir daqui. O fato de que, no Santos, a virtude atrapalha. O peso de que o raio já caiu duas, três, vezes, e aí se espera que caia sempre, sempre e sempre.

Perdoa-se praticamente tudo de um técnico do Santos. Menos que ele não dê à base a moral que parte de diretoria e torcida esperam. O quanto é isso? Sei lá, é difícil quantificar. Mas não é pouca coisa.

É irritante, triste mesmo, ver um técnico sair do time - e para isso nem importa tanto ele ter sido demitido ou ter pedido demissão - por não atender a um requisito metafísico, celestial, supersticioso ou o diabo. A base do Santos já contribuiu ao longo da história? Ô! Demais! Possivelmente mais do que qualquer outro time brasileiro. Mas não é por isso que devemos ser reféns dela. Não é por isso que as virtudes (ou defeitos) táticos e técnicos do "professor" devem ser jogados a segundo plano.

Para que não pareça implicância/delírio meu, analisem essa frase de Modesto na coletiva de hoje: "Não adianta contratar um treinador que não tenha a alma do torcedor santista. Temos achar um treinador que se engaje no perfil do clube". O que é essa alma? Uma matéria de A Tribuna sugere os caminhos: "Para definir o novo treinador, o Peixe analisa três fatores - vocação ofensiva, experiência em lidar com jogadores da base e salário baixo"

É isso aí rapaziada. "Vocação ofensiva" e "experiência em lidar com jogadores da base". Afinal, vale mais perpetuar um estereótipo do que contratar um profissional que entenda de futebol e, ao observar o time, identifique se é o caso de montar time que vá pra cima ou não, que utilize a base ou contrate, né não?

Sei lá, se essa é a "alma do torcedor santista", me senti um pouco mais desalmado hoje. Pra mim, a alma do santista é a de quem gosta de ver o time vencer e mostrar um futebol consistente - seja com contratação ou base, seja com ofensividade ou com espera.

E pra fechar, leio que dois dos mais cotados para a vaga são Dorival Júnior e Wagner Mancini. Os dois passaram recentemente pelo Santos. O que achei do trabalho deles? O de Mancini foi médio, quebrou um galho; já o de Dorival posso resumir com uma só palavra: ESPETACULAR. Foi o melhor trabalho de um técnico que vi no Santos desde que comecei a acompanhar o time pra valer, a partir de 1991 (posso depois fazer outro post para desenvolver melhor esse ponto de vista).

Acontece que isso não credencia em nada os dois para agora, em 2015, com o contexto que estamos vivendo. Não esqueçamos que, ano passado, Mancini foi rebaixado e Dorival quase sofreu a degola no Brasileirão.

Mas, bem, acho que de nada adianta ficar reclamando. Logo logo um deles (ou outro de capacidade técnca similar) estará na Vila. E um pouquinho mais logo logo, estará no olho da rua e brigando nos tribunais com o Santos por multas e afins. E assim a vida segue.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Nossa complacência com os erros de arbitragem que protegem os times pequenos

Tá certo que a maior parte das pessoas nem sabe que teve jogo dos estaduais ontem (eu próprio não lembrava), mas o Vasco x Barra Mansa em São Januário, que acabou 1x1, foi marcado por um episódio curioso: aos 45 do segundo tempo, o Vasco marcou o gol que decretaria a sua vitória. O tento foi marcado em condição legal, mas acabou anulado pelo juiz.

Não, não é o primeiro caso de jogo com erro de arbitragem (e nem o erro de arbitrgem mais importante de ontem), mas quero debatê-lo por ter identificado nele - ou melhor, na ausência total de repercussões sobre ele - a comprovação de algo que já tenho sacado há um tempo.

Que é o seguinte: erros de arbitragem contra times menores geram muito, mas muito mais burburinhos do que aqueles em que o time grande é prejudicado.

Fica fácil perceber isso na comparação entre a (não) polêmica do jogo de ontem e o estardalhaço feito após a partida do último fim de semana, em que o Corinthians venceu o Botafogo de Ribeirão Preto por 2x1. Ambos os gols corintianos foram de pênalti - e os dois pênaltis foram pra lá de controversos. O juiz da partida, Marcelo Alfieri, foi afastado pela Federação Paulista por conta de seu péssimo desempenho no Itaquerão.

Algum corintiano mais fanático poderia explicar a distorção entre os dois casos na linha do "todo mundo persegue o Corinthians, contra a gente é tudo mais difícil". Mas, e nem preciso me estender nisso, essa argumentação não dura cinco minutos. O fenômeno se repete em tudo quanto é ocasião similar - tente se lembrar qual foi o último escândalo de arbitragem que envolveu um erro contrário ao time grande. Não falo do erro em si, mas de um rebuliço. Dificilmente você lembrará.

Acredito que essa discrepância reside no nosso tão distorcido senso de justiça. Temos dó dos times pequenos, especialmente os mais tradicionais (onde o Botafogo de Ribeirão se encaixa), e por isso queremos vê-los em destaque, principalmente aprontando contra as equipes grandes. Daí desenvolvemos um espírito meio Robin Hood - tudo bem roubar um Corinthians aqui, um Grêmio ali, um Vasco acolá. Mas não o oposto, pelo amor de deus. Aí já é vandalismo, para usar um bordão consagrado em 2013.

Não sei qual será o destino de Raphael Silvano Ferreira, o apitador de Vasco x Barra Mansa. Pode ser que ele até receba uma punição maior do que seu colega paulista. Mas, ao menos por enquanto, escapou de toda a pressão pública que Marcelo Alfieri recebeu.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Quem entendeu Aranha?

Quando começou a leva de processos dos jogadores insatisfeitos com os salários atrasados no Santos, minha postura inicial foi muito simples: defesa ampla, geral e irrestrita dos atletas. Clube (ou qualquer empresa, aliás) que não paga o que promete tem mais é que responder na justiça. Acho que já estamos, todos nós, bem maduros e crescidinhos e nem é preciso gastar linhas explicando que futebol é profissional, que os caras precisam pagar contas e assim por diante.

Mas o que parecia simples foi ganhando contornos estranhos no caso de Aranha. Primeiro com as declarações dele em 21 de janeiro, quando participou de audiência na ocasião. Lá disse que a procura por outros arqueiros - Jeferson, Ochoa e Renan foram publicamente ventilados - deixou claro para ele que o ciclo no Santos já havia se esgotado. Hum.

E hoje, ao se apresentar ao Palmeiras, Aranha falou com todas as letras: "não estou saindo do Santos por causa dos salários atrasados". E voltou a repetir o papo do ciclo em esgotamento - não sem antes, de maneira contraditória, declarar respeito a diretoria e torcida peixeira.

Confesso que acabei não entendendo nada.

Processar um clube que deve salários, como eu já disse, é algo mais do que compreensível. O que é estranho é brigar na justiça com a alegação de que a contratação de outros atletas o afetou. E, dias depois, fechar com um clube que tem um titularíssimo no gol: no caso, Fernando Prass.

Alguém explica?

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Quando a virtude atrapalha

O ano começa bizarro para o Santos, como todos já sabem. O ídolo Arouca, o bom (ou, na pior das hipóteses, médio) Aranha, o quebra-galho Mena, o capitão Edu Dracena e o ruim Leandro Damião deixaram o clube - e todos pela porta dos fundos, após pendências salariais. Os reforços que chegaram (Werley, Valencia, Chiquinho, Elano, Ricardo Oliveira) não são nenhuma garantia de bom futebol. E nada nos faz ter a certeza de que a sangria já acabou - e que os principais jogadores do elenco atual, como Robinho, Lucas Lima e Geovânio, permanecerão na Vila.

Não é o primeiro início de ano ruim para o Santos, claro. Lembramos bem de algumas temporadas, como 2002 (sim, 2002) e 2008, quando as perspectivas eram tão ou mais assustadoras do que as de agora.

O duro é ver, mais uma vez, o cenário de crise reforçando uma das mentalidades que mais irrita em relação ao Santos Futebol Clube: a crença inabalável de que as categorias de base, sempre elas, vão resolver tudo de forma mágica, indiscutível, e que o Santos sairá por cima, carregado pelos braços de sua garotada.

A filosofia aparece nos comentários de santistas por aí. Não temos Aranha? Vamos de Gabriel Gasparotto, "que foi bem na Copinha". Leandro Damião foi fraco e Thiago Ribeiro decai a cada dia? Deixa pra lá, é só colocar Stefano Yuri e Jorge Eduardo para jogar. Arouca, ídolo de tantos jogos e títulos, brigou e saiu? Sem problemas: basta escalar Lucas Otávio. "Esse menino é bom".

E assim a torcida do Santos legitima a diretoria do clube para se abster, para não se planejar, crescer, contatações. A frase do presidente Modesto Roma Júnior destcada no Painel da Folha ontem expressa bem a mentalidade: "O Santos é o Santos, sempre tem uma luz no fim do túnel". Pois é. Viva a magia, não é mesmo?

Não vou aqui desprezar completamente a identidade do clube para que torço. É óbvio que a base deu inúmeras alegrias aos santistas. Mas não podemos esquecer que de onde saíram Neymar, Robinho e Pelé, também saíram Wesley, Tiago Luís, Carleto, Halisson e outros que nunca deram em nada. Não podemos achar que tudo se resolverá num passe de mágica.

Cabe registrar que o Santos está longe de ser o único time brasileiro que sofre o estigma da "virtude que atrapalha". O Corinthians penou muito, e ainda sofre com isso, com a mentalidade do "tem que ser sofrido", que também motivou o time a abrir mão de planejamentos e reflexões sérias. Já o São Paulo sofre o oposto - às vezes parece que torcida e diretoria precisam se exibir como planejados e diferenciados, como no papo que apareceu recente de que o clube busca um técnico estrangeiro. Vejo isso ainda no Grêmio e sua necessidade de reverenciar quem fale espanhol, seja qual for o nível técnico do sujeito.