O grito "ódio eterno ao futebol moderno" não é novidade, como já sabemos. Ganhou corpo com os torcedores (?) do Juventus e teve materialidade nos últimos dias, com faixas mostradas pela torcida do Corinthians e do Bahia.
Já expus várias vezes minha visão sobre essa ótica (aqui, aqui, aqui). A considero um tanto quanto utópica, principalmente por se referir a uma época "perfeita" que, na boa, nunca existiu. Mas nem quero, agora, entrar no juízo de valor e debater se o tal futebol moderno é bom ou ruim; a busca é compreender o marco temporal de quem advoga essa causa.
Quando começou esse dito futebol moderno?
A questão me intriga bastante porque comecei a acompanhar futebol no início dos anos 1990. Época de fiasco em Copa do Mundo, de começo de esvaziamento de estádios, de vôlei ameaçando o lugar do futebol como esporte número 1 dos brasileiros. Fui, digamos, "alfabetizado" no futebol em uma época de crise e num momento em que o choque entre o futebol contemporâneo e o do passado era demasiadamente explorado - e o contraste era de fácil realização, afinal comparava-se Pelé com Silas, Vavá com Bismarck, Gilmar com Acácio.
Portanto, para mim ficava claro que o corte entre o futebol moderno e o futebol do passado havia sido feito mais ou menos naquela época: quando as camisas passaram a ter patrocínio estampado, quando os próprios jogadores tinham seus anunciantes, quando os craques (e os nem tanto) começaram a ir ao exterior, quando os jogadores começavam a trocar de clube com grande velocidade.
Mas aí vejo a molecada adepta do "ódio eterno ao futebol moderno" se expressar e minha cabeça dá um grande nó. Embora humorísticas, páginas como Legado da Copa e Cenas Lamentáveis revelam, por meio de comentários dos seus frequentadores, críticas a ícones como David Luiz e Neymar e elogios a outros de "antigamente" (bota aspas nisso) como Odvan, Edmundo, Túlio... Há outras ainda mais sérias, como essa, que vão na mesma linha: atacam a "geração 7x1" mas reverenciam uma atmosfera futebolística já cunhada em TVs a cores, estádios com limitação reduzida e, em alguns casos, turbinada pelas mídias sociais.
Tempos atrás, outra confusão se fez na minha mente quando vi um post elogiando a seleção de 2002. Não que aquele grupo, campeão com sete vitórias em sete jogos, não mereça elogios - a questão é que as loas não se davam por questões esportivas, mas sim por enfoques como "esses respeitavam a camisa", "jogavam sério", "não tinham vaidade", "não pensavam em dinheiro"... lendo o texto, fiquei na dúvida se abordava mesmo um grupo dos anos 2000, repleto de atletas com contratos milionários com empresas de material esportivo, ou de, sei lá, um elenco da várzea da década de 1950...
Porém, o tumulto maior na dificuldade para o estabelecimento do marco temporal se fez quando descobri esse vídeo que vai abaixo, que fala sobre o surgimento de Careca - aquele, ex-Guarani, São Paulo, Napoli e seleção. Narrado por Sérgio Chapelin, o texto - de 1978!! - diz:
"Suas jogadas, lembrando os craques de antigamente, mataram a saudade dos grandes lances, da ousadia do jogador brasileiro. Uma ousadia que marcava o jogador formado nas peladas, conhecedor profundo da bola. O menino Careca fez reviver o nosso futebol, com o seu futebol protegido pelos santos".
Ou seja, em 1978 essa crítica já aparecia.
E aí, meus caros? O futebol moderno começou antes de 1978, é isso?
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