terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Sobre tapetões e os diferentes conceitos de justiça

Esse não é um texto sobre o fim do Campeonato Brasileiro e a tal escalação irregular do jogador da Portuguesa que pode levar o clube do Canindé à Série B em 2014 e salvar da degola o Fluminense.

Não é um texto sobre esse episódio - mas sim motivado por ele.

Todas as vezes em que surge a possibilidade de que um clube perca pontos por questões extra-campo - seja a perda algo razoável ou absurdo, seja uma possibilidade concreta ou um delírio individual - um grito ecoa por todos os cantos, dito por todas as bocas possíveis: "querem roubar o que não foi conquistado na bola! Isso não é justo!".

Hum, então. É sobre isso que o texto quer colocar o foco. Sobre a palavra "justo", sobre esse conceito de justiça futebolística.

Quando um campeonato está para se iniciar, todos os times assinam seu regulamento. Que, a partir desse momento, passa a ser uma constituição para todos os envolvidos na disputa. Lá se fala de tudo: sobre mandos de campo, sobre critérios de desempate, sobre características dos estádios e, também, sobre punições.

E se um time pisa na bola e descumpre algo que está previsto no regulamento que ele próprio assinou, aí, meu amigo, não pode chorar o que veio depois.

Não consigo conceber a ideia de criticar um time que pede uma punição a um adversário que descumpriu o regulamento. Se o descumprimento está nítido nas regras, e se a punição é também prevista pelas normas, não há rigorosamente nada de injusto - de trapaça, de mutreta, de o que for - em recorrer a essa via.

"Ah, mas isso vai mudar o resultado conseguido dentro de campo". Não, meu caro. Não vai "mudar o resultado" simplesmente porque o resultado em questão não era para ter acontecido. Um time que escala um jogador irregular está inserindo no contexto da partida um fator que deveria estar externo a ela. E pronto! Não muda nada se o sujeito foi reserva, se mal tocou na bola, se mais atrapalhou do que ajudou. Ele simplesmente não deveria estar lá. E mais que isso: seu clube deveria estar ciente disso. Se sabia da irregularidade, e não atuou para coibi-la, cabe a punição.

É preciso ter mais cuidado ao adotar essa linha do "o que aconteceu dentro de campo é sagrado". Não, não. As regras a respeito da inscrição de jogadores - e de um monte de circunstâncias extra-campo, como condições do estádio, pagamento de tarifas e outras - existem por um propósito, e devem ser respeitadas.

(Um paralelo com o mundo da política: é comum políticos serem eleitos e, posteriormente, a Justiça Eleitoral detectar que houve alguma irregularidade na campanha, e determinar a cassação do sujeito. Que, invariavelmente, apela para o discurso do "querem calar o voto popular" ou "a Justiça decidiu criar um segundo turno". Mantenho o raciocínio: se as regras forem descumpridas, que se aplique a punição. Não existe "vontade popular" mais importante do que as normas estabelecidas, também, pelo povo.)

Agora, sim, trago o debate para o caso atual e o imbróglio Portuguesa-Fluminense. Muita água ainda vai passar por debaixo da ponte. Parece realmente que a Lusa fez besteira, mas tem a seu favor o fato de que a CBF talvez não tenha sido muito clara em sua decisão. O que rejeito é a gritaria - precoce! - em torno do Fluminense por conta do episódio.

Como se o clube das Laranjeiras tivesse culpa por uma suposta bobagem praticada pela diretoria lusitana. Como se a situação atual tivesse alguma relação com as viradas de mesa de 1996 e 2000. E como se, pelo fato de o Flu ser um time do Rio, já desfrutasse de uma imutável condição de vilão perante a eterna coitadinha Portuguesa.

Acho que temos, todos, condição de travar um debate mais inteligente.

3 comentários:

Afonso disse...

Muito bom Olavo!

Unknown disse...

muito bomo texto, mas no final encontrei um pequeno erro, o flu nao virou a mesa anteriormente em 96 e 2000.

Unknown disse...

muito bom, mas encontrei um erro, o flu nao virou a mesa em 96 e 2000