Eu não lembro que roupa estava vestindo. Também não consigo recordar, com clareza, o que fiz na manhã daquele dia, até o momento do duelo. Ironias da vida - logo a minha memória, o traço da minha personalidade do qual mais gosto, me deixa na mão e me impede de fazer uma descrição um pouco mais viva daquele 15 de dezembro.
Também não consigo lembrar o que se passou na minha cabeça aos 43 minutos e três segundos do jogo.
Há um chavão, cada vez mais em uso, que odeio: "só quem passou por isso consegue entender, não há como explicar, só estando lá pra saber". Acho que isso virou um recurso para superar uma certa incapacidade para procurar palavras que expressem sentimentos sinceros.
Então não é a ele, decididamente, que vou recorrer para falar do que ocorreu quando Elano empurrou a bola para as redes - ou, mais precisamente, quando o juiz confirmou o gol de empate. Até porque eu sei bem o que houve comigo. Lembro com precisão do meu sentimento. Alegria, é claro. Alívio, sem dúvidas. Consagração, júbilo, prazer, satisfação, sei lá.
A questão é que mais importante do que a alegria que senti naquela ocasião e em tantas outras por causa do futebol - títulos paulistas, o Brasileiro de 2004, Libertadores 2011 e outros - o que ocorreu comigo, ali, naquele instante, foi uma sensação de que minha vida estava sendo dividida em duas. Sabem a metáfora do "nascer de novo"? Então, talvez tenha sido um pouco por ali.
Não se trata de exagero afirmar isso. Quem é torcedor sabe que o clube de futebol ocupa, em nossas vidas, uma posição de protagonismo. E para mim - e acredito que a todos os santistas - a experiência de ser torcedor do Santos modificou-se integralmente após aquele dia.
Acho que não cometo nenhum pecado ao afirmar que os 11 jogadores do Santos - mais os suplentes e até mesmo o trio de arbitragem do 15 de dezembro de 2002 - fizeram, sobre minha vida, um efeito que pouquíssimas coisas ou pessoas já fizeram.
Agradeço a eles. Mais: repasso a eles uma espécie de responsabilidade, de obrigação de saber o que fizeram com a vida de um cara que contava 22 anos à época e tinha, naquele momento, o futebol como uma das coisas mais importantes da sua vida - e ainda tem nos dias atuais, com tanta intensidade quanto a daquela época, ou ainda maior.
Não sei o que a vida me reserva nos próximos 68 anos (no mínimo) que pretendo viver. Sei que acho pouco provável que ela me traga algo similar ao que senti aos 43 minutos daquele jogo.
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