Exemplo de piada baseada na frase "da Clarice Lispector", extraída do http://evitavaviver.tumblr.com/
Mas, enfim, brincadeiras à parte, não é que a tal frase tem lá o seu valor? Pô, o sentimento por ela descrito, é, sim, algo que todo mundo já pensou vez ou outra. Costumamos ser surpreendidos por nós mesmos lembrando com afeto de coisas que simplesmente não eram boas para nós - por exemplo, é o que ocorre com pessoas que subiram de patamar financeiro e que se recordam com carinho de quando andavam de ônibus lotado. Ou mesmo "lembramos" de situações que não vivenciamos. E aí os exemplos são vários. É só pensar na molecada de 15 anos reverenciando a música dos anos 80 (não que haja problema em gostar de algo executado antes do nosso nascimento - por essa lógica, eu não poderia apreciar Beatles; o problema é fazê-lo em tom muito comparativo e/ou saudoso, alcançando assim o ridículo) ou, descendo mais o nível, gente chateada com a política brasileira atual que deseja o retorno da ditadura.
Pois bem: toda essa introdução foi para dizer que a "saudade de algo o qual mal vivi ou evitava viver" é o sentimento que, a meu ver, tem pautado grande parte das críticas feitas aos novos estádios brasileiros, em especial ao Maracanã.
Esqueçam as contestações em relação aos gastos da obra, à demora para entrega das arenas ou a problemas estruturais que os estádios apresentam; não é a isso que me atenho agora (até porque concordo com quase a totalidade das críticas desse perfil). Quero mais falar sobre uma suposta perda de "identidade", de "brasilidade" que tem sido apontada como uma falha incorrigível dos novos campos.
Ora, eu tenho 32 anos, e acompanho o futebol pra valer desde o início da década de 1990. Sempre tive no Maracanã uma arena digna de todo o respeito do mundo, mas também um local marcado por reformas, interdições, fechamentos e coisas parecidas. Paremos para pensar: quais foram os graaaaandes jogos, aqueles dignos de integrar de maneira incontestável o rol das maiores partidas, que ocorreram no Mário Filho nos últimos 10 anos? Houve duelos de peso - final de Libertadores, decisões de Copa do Brasil, última rodada de Brasileirão que deu ao clube de maior torcida do país a taça - mas em nenhum deles aquela mística do Maracanã esteve presente. Já não estavam lá as 200 mil pessoas, a geral ensandecida, a democracia tresloucada, a festa incontida. Ao contrário: vivia-se ali o contexto do futebol brasileiro pós onda de violência dos anos 90, com uma torcida ressentida em ocupar maciçamente as arenas e autoridades policiais e governamentais buscando garantir a segurança por meio da redução de espaços, segregação entre torcedores e diminuição da intensidade da festa.
Admita, amigo leitor com menos de 40 anos que lamenta "não ver mais" a atmosfera do Maracanã: o estádio retratado na foto abaixo não fez parte da sua vida. É algo que você vivenciou em um ou outro jogo pontual ou por meio da história, como faz um garoto da atualidade ao curtir Legião Urbana com base nos filmes que estão em cartaz. É dura, mas é essa a realidade.
Falei sobre o "o qual mal vivi", vem agora o "evitava viver". O encolhimento de público foi uma das principais marcas do futebol nacional a partir dos anos 90. A violência é talvez a principal razão, mas não a única; somam-se a ela a falta de conforto, a explosão de opções de lazer (quantos shoppings havia no passado e quantos há hoje?), o encarecimento dos preços dos ingressos e outros componentes.
O fato é que o "estádio como programa das massas e alegria do povão" é algo que, digamos a verdade, já ficou pra traz faz tempo, e não só no Maracanã. A média de público do Corinthians, o time que mais levou gente aos estádios no Brasileiro de 2012, foi de pouco mais de 25 mil pessoas. Pouco, muito pouco, se pensarmos no tamanho em números absolutos da torcida corintiana e na suposta paixão inata que os brasileiros supostamente têm por futebol.
A relação entre os brasileiros e seus estádios precisava de um choque. Uma revolução - para que, se não pudéssemos resgatar o espírito das massas que vigorava até os anos 70, ao menos conseguíssemos reverter a letargia chata imposta a nós na última década e na anterior.
E isso pode vir com as atuais arenas novas. Conforto, espaço e comodidade podem ser a chave para trazer de volta - ou pela primeira vez! - um público distante dos estádios. Há condições para que o novo panorama reverta todos os defeitos que tanto criticamos ao longo dos anos - o "evitava viver" da sentença-meme-título do post. Ou alguém aí acha bonito os estádios alvo de violência e depredação?
Acho lícito, lógico e elogiável que respeitemos o que veio antes de nós e que tenhamos visão crítica ao que nos é imposto. Temos direito de contestar e o dever de debater, de maneira prazerosa, tudo o que cerca o esporte que tanto amamos. Mas é importante que o processo seja feito com racionalidade. Para que nossas críticas tenham credibilidade. E para que não se tornem vagas como uma frase falsamente atribuída a uma escritora morta há anos.
O fato é que o "estádio como programa das massas e alegria do povão" é algo que, digamos a verdade, já ficou pra traz faz tempo, e não só no Maracanã. A média de público do Corinthians, o time que mais levou gente aos estádios no Brasileiro de 2012, foi de pouco mais de 25 mil pessoas. Pouco, muito pouco, se pensarmos no tamanho em números absolutos da torcida corintiana e na suposta paixão inata que os brasileiros supostamente têm por futebol.
A relação entre os brasileiros e seus estádios precisava de um choque. Uma revolução - para que, se não pudéssemos resgatar o espírito das massas que vigorava até os anos 70, ao menos conseguíssemos reverter a letargia chata imposta a nós na última década e na anterior.
E isso pode vir com as atuais arenas novas. Conforto, espaço e comodidade podem ser a chave para trazer de volta - ou pela primeira vez! - um público distante dos estádios. Há condições para que o novo panorama reverta todos os defeitos que tanto criticamos ao longo dos anos - o "evitava viver" da sentença-meme-título do post. Ou alguém aí acha bonito os estádios alvo de violência e depredação?
Acho lícito, lógico e elogiável que respeitemos o que veio antes de nós e que tenhamos visão crítica ao que nos é imposto. Temos direito de contestar e o dever de debater, de maneira prazerosa, tudo o que cerca o esporte que tanto amamos. Mas é importante que o processo seja feito com racionalidade. Para que nossas críticas tenham credibilidade. E para que não se tornem vagas como uma frase falsamente atribuída a uma escritora morta há anos.
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