segunda-feira, 10 de junho de 2013

É estranho sentir saudade de algo o qual mal vivi ou evitava viver

A frase que dá o título a esse post foi uma das piadas mais célebres da internet brasileira - um meme, pra usar a linguagem técnica - há alguns anos. Trata-se de uma citação inventada por alguém desconhecido e que foi atribuída, de brincadeira, a Clarice Lispector. Os autores da piada disseminaram a sentença por aí e apenas se deram ao trabalho de dar risada do povo que, sem se preocupar com a autenticidade do adágio, o propagava em seus perfis no Orkut (sim, ele ainda tinha força) e no Facebook.


Exemplo de piada baseada na frase "da Clarice Lispector", extraída do http://evitavaviver.tumblr.com/

Mas, enfim, brincadeiras à parte, não é que a tal frase tem lá o seu valor? Pô, o sentimento por ela descrito, é, sim, algo que todo mundo já pensou vez ou outra. Costumamos ser surpreendidos por nós mesmos lembrando com afeto de coisas que simplesmente não eram boas para nós - por exemplo, é o que ocorre com pessoas que subiram de patamar financeiro e que se recordam com carinho de quando andavam de ônibus lotado. Ou mesmo "lembramos" de situações que não vivenciamos. E aí os exemplos são vários. É só pensar na molecada de 15 anos reverenciando a música dos anos 80 (não que haja problema em gostar de algo executado antes do nosso nascimento - por essa lógica, eu não poderia apreciar Beatles; o problema é fazê-lo em tom muito comparativo e/ou saudoso, alcançando assim o ridículo) ou, descendo mais o nível, gente chateada com a política brasileira atual que deseja o retorno da ditadura.

Pois bem: toda essa introdução foi para dizer que a "saudade de algo o qual mal vivi ou evitava viver" é o sentimento que, a meu ver, tem pautado grande parte das críticas feitas aos novos estádios brasileiros, em especial ao Maracanã.

Esqueçam as contestações em relação aos gastos da obra, à demora para entrega das arenas ou a problemas estruturais que os estádios apresentam; não é a isso que me atenho agora (até porque concordo com quase a totalidade das críticas desse perfil). Quero mais falar sobre uma suposta perda de "identidade", de "brasilidade" que tem sido apontada como uma falha incorrigível dos novos campos.

Ora, eu tenho 32 anos, e acompanho o futebol pra valer desde o início da década de 1990. Sempre tive no Maracanã uma arena digna de todo o respeito do mundo, mas também um local marcado por reformas, interdições, fechamentos e coisas parecidas. Paremos para pensar: quais foram os graaaaandes jogos, aqueles dignos de integrar de maneira incontestável o rol das maiores partidas, que ocorreram no Mário Filho nos últimos 10 anos? Houve duelos de peso - final de Libertadores, decisões de Copa do Brasil, última rodada de Brasileirão que deu ao clube de maior torcida do país a taça - mas em nenhum deles aquela mística do Maracanã esteve presente. Já não estavam lá as 200 mil pessoas, a geral ensandecida, a democracia tresloucada, a festa incontida. Ao contrário: vivia-se ali o contexto do futebol brasileiro pós onda de violência dos anos 90, com uma torcida ressentida em ocupar maciçamente as arenas e autoridades policiais e governamentais buscando garantir a segurança por meio da redução de espaços, segregação entre torcedores e diminuição da intensidade da festa.

Admita, amigo leitor com menos de 40 anos que lamenta "não ver mais" a atmosfera do Maracanã: o estádio retratado na foto abaixo não fez parte da sua vida. É algo que você vivenciou em um ou outro jogo pontual ou por meio da história, como faz um garoto da atualidade ao curtir Legião Urbana com base nos filmes que estão em cartaz. É dura, mas é essa a realidade.

Falei sobre o "o qual mal vivi", vem agora o "evitava viver". O encolhimento de público foi uma das principais marcas do futebol nacional a partir dos anos 90. A violência é talvez a principal razão, mas não a única; somam-se a ela a falta de conforto, a explosão de opções de lazer (quantos shoppings havia no passado e quantos há hoje?), o encarecimento dos preços dos ingressos e outros componentes.

O fato é que o "estádio como programa das massas e alegria do povão" é algo que, digamos a verdade, já ficou pra traz faz tempo, e não só no Maracanã. A média de público do Corinthians, o time que mais levou gente aos estádios no Brasileiro de 2012, foi de pouco mais de 25 mil pessoas. Pouco, muito pouco, se pensarmos no tamanho em números absolutos da torcida corintiana e na suposta paixão inata que os brasileiros supostamente têm por futebol.

A relação entre os brasileiros e seus estádios precisava de um choque. Uma revolução - para que, se não pudéssemos resgatar o espírito das massas que vigorava até os anos 70, ao menos conseguíssemos reverter a letargia chata imposta a nós na última década e na anterior.

E isso pode vir com as atuais arenas novas. Conforto, espaço e comodidade podem ser a chave para trazer de volta - ou pela primeira vez! - um público distante dos estádios. Há condições para que o novo panorama reverta todos os defeitos que tanto criticamos ao longo dos anos - o "evitava viver" da sentença-meme-título do post. Ou alguém aí acha bonito os estádios alvo de violência e depredação?

Acho lícito, lógico e elogiável que respeitemos o que veio antes de nós e que tenhamos visão crítica ao que nos é imposto. Temos direito de contestar e o dever de debater, de maneira prazerosa, tudo o que cerca o esporte que tanto amamos. Mas é importante que o processo seja feito com racionalidade. Para que nossas críticas tenham credibilidade. E para que não se tornem vagas como uma frase falsamente atribuída a uma escritora morta há anos.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Vai dar Bósnia em 2014: o "Imagine na Copa" junta-se ao "pavê ou pacumê"

A seleção da Bósnia está perto, muito perto da Copa de 2014. Nesta sexta-feira, os Bósnios fizeram 5x0 na Letônia fora de casa e dispararam na liderança do Grupo G das Eliminatórias europeias. Estão a quatro pontos da Grécia, a vice-líder, e se vencerem seu próximo jogo, em casa contra a Eslovênia, garantem a vaga no Brasil.

Será a estreia da seleção em Copas do Mundo. Apesar disso, não chega a ser exatamente uma surpresa. Já há tempos, a Bósnia bate na trave - perdeu apenas na repescagem a vaga para 2010.

Mas o mais curioso - e temerário - da classificação da Bósnia para a Copa do Mundo é o tanto de "piadinhas do pavê" que a seleção vai causar. Uma já está no título deste post. E outras pipocarão, sem dúvida.

Pensem no mais trágico: a Copa da Bósnia será logo a sediada no Brasil. Vai dar Bósnia para tudo quanto é canto, amigos. A Bósnia vai se espalhar. Já prevejo algum site mais "engraçadinho" fazendo montagens com fotos de filas nos aeroportos, estradas em má qualidade, problemas nos estádios e assim por diante.

Afinal, se hoje já dá pra fazer piadinha sem vergonha com a possível presença da Bósnia no Brasil, imagina na Copa!

PS: um aspecto interessante (e, agora, mais sério) sobre a classificação da Bósnia é que o fato fará com que a quarta ex-república iugoslava garanta presença em uma Copa do Mundo desde a extinção do país, em 1991. Croácia, Sérvia (com e sem Montenegro) e Eslovênia já tiveram suas oportunidades, agora é a Bósnia que se aproxima. E até mesmo Montenegro pode avançar - a seleção lidera seu grupo, que tem a Inglaterra como favorita. É um retrospecto bem, mas bem interessante, principalmente se contarmos que estamos falando de países cuja população não é das maiores. Para efeito de comparação, é só pensarmos que a União Soviética (muito maior e mais populosa), dissolvida à mesma época que a Iugoslávia, gerou apenas dois países que se classificaram para a Copa, Rússia e Ucrânia.

sábado, 1 de junho de 2013

Desviou na zaga e enganou o goleiro

Um dos lances mais traiçoeiros do futebol é quando a bola chutada desvia na zaga e mata o goleiro. O vídeo abaixo traz 32 gols em que aconteceu exatamente isso. Mérito do atacante, mas uma sortezinha de vez em quando sempre ajuda.

Tem gol do Milan, do Internacional, do Juazeiro, da seleção inglesa. Sobre o Corinthians, sobre o Barcelona, sobre a seleção de Mali, sobre o Noroeste de Bauru. Do Neymar, do Fred, do Podolski e do Edson Di.

Há inclusive um dos mais importantes e decisivos (é sério!) gols da história do Santos.

Vejam aí!


Aqui tem que ser trabalho, meu filho

O acaso e a sorte fazem parte dos times campeões. Com o Santos de 2011 não foi diferente. Ao mesmo tempo em que a experiência com Adilson Batista na Vila Belmiro se confirmava como uma má ideia, Muricy Ramalho se enrolava no Fluminense e pedia demissão do tricolor do Rio.

Era uma conspiração dos astros. Um fato ocorrido a mais de 500 quilômetros de Santos poderia fazer com que o time de Neymar se resolvesse na Libertadores e, ainda que não levantasse a taça, ao menos revertesse o vergonhoso vexame que seria uma eliminação na primeira fase em um grupo que tinha também Cerro Porteño, Deportivo Táchira e Colo Colo.

A correção veio. Muricy estreou em um épico jogo, o 2x1 sobre o Cerro no Paraguai, decisivo para que o Santos se mantivesse vivo no torneio (além de ser a última boa partida de Paulo Henrique Ganso pelo Peixe). A partir daí, construiu um time sólido, aguerrido, que no limite (venceu TODOS os mata-matas ganhando um jogo pelo placar mínimo e empatando o outro) trouxe a histórica Libertadores para a Vila Belmiro.

Acontece que, aí, no momento em que deu a entrevista coletiva após a decisão contra o Peñarol, Muricy falou uma frase-chave: "eu merecia esse título".

Ali, naquela declaração de quatro palavras, o técnico descarregou uma frustração que o acompanhava havia anos. E indicava: chegara ao auge. Ao ápice da carreira de um treinador de futebol no Brasil. Sim, há o Mundial de Clubes, mas este é um torneio mais na base da fatalidade, do improvável. Há também a seleção, recusada por ele um ano antes.

A impressão que tenho, dois anos depois daquilo, é que a frase foi a sina para deixar claro que o "aqui é trabalho, meu filho" já não mais faria sentido.

Porque Muricy deixou de trabalhar. Deixou de criar alternativas táticas e técnicas dentro do Santos que comandava. Deixou de olhar para as categorias de base do clube e para outros times na busca de reforços de qualidade. Deixou de observar os adversários e de estudá-los. E deixou o Santos à mercê de um sistema que não funcionava, não fazia bem a ninguém. E nem, claro, ao Neymar. Ou alguém discorda que, apesar de permanecer gênio-mito-melhor-jogador-do-Brasil-na-atualidade o moleque rendeu menos em 2013 do que fizera em anos anteriores?

E é por isso que a demissão de Muricy, anunciada ontem, foi benéfica ao Santos. Não, eu não espero um técnico que resolva todos os problemas de uma hora para outra; quero simplesmente um cara que queira trabalhar, se desenvolver e desenvolver o time que comanda. Alguém que não se sinta no auge. Alguém que saiba que o topo sempre pode ser alcançado mais e mais vezes.